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  • Foto do escritorMarcelo Trigueiros

Coronavírus x empregos: 5 alternativas para as empresas lidarem com a crise

Os primeiros casos de coronavírus (COVID-19) foram diagnosticados na China entre final de 2019 e princípio de 2020 (1). A doença se espalhou pelo mundo, chegando ao Brasil no final de fevereiro (2). Desde então, o número de casos em nosso país só cresce (3). As características da doença e cuidados para prevenção alteraram a vida e rotina dos brasileiros, inclusive e especialmente as relações de trabalho (4).


De fato, no transporte para o serviço, no estabelecimento profissional, restaurantes etc, os trabalhadores estão expostos a riscos. Além disso, toda a coletividade – o que naturalmente inclui clientes, consumidores, etc - tem sido orientada a alterar seu comportamento, permanecendo em casa, na medida do possível (5). Consequentemente, há uma natural redução da demanda por trabalho, principalmente por atendimento presencial.


Nesse cenário, os empregadores tem se deparado com a necessidade de fazer ajustes para zelar pela segurança e saúde de seus empregados ou mesmo paralisar suas atividades. Ao mesmo tempo, precisam assegurar a sobrevivência dos seus negócios.


Na prática, isso tem significado modificação da forma de trabalho, expressiva redução ou mesmo a suspensão temporária das atividades, sendo que em princípio nada disso desobriga o empregador de seguir pagando os salários de seus empregados, pois a empresa é responsável pelos riscos da atividade, conforme artigo , da CLT (6). É por isso que apresentamos, nesse artigo, 5 (cinco) alternativas para que as empresas possam lidar com essa difícil situação, expondo os principais benefícios e dificuldades de cada uma.


Sumário do artigo:


1. A legislação atual não tem uma solução “sob medida” para os efeitos da pandemia do COVID-19 sobre contratos de trabalho

2. Férias

3. Licença remunerada

4. Banco de Horas

5. Trabalho em casa

6. Norma Coletiva (Convenção ou Acordo)

7. E as empresas que não podem parar?

8. Qual a alternativa mais adequada para a sua empresa?

9. Conclusão

10. Contato em caso de dúvidas

11. Referências




1.A legislação atual não tem uma solução “sob medida” para os efeitos da pandemia do COVID-19 sobre contratos de trabalho


Não há na legislação vigente uma solução “sob medida” para a situação que ora enfrentamos. Em outras palavras: a modificação, redução ou mesmo suspensão das atividades por iniciativa dos empregadores, ainda que em decorrência do quadro de pandemia que enfrentamos, em princípio não os desobriga de pagarem os salários e de continuarem zelando pelas demais obrigações decorrentes do contrato de trabalho.


Com o avanço do quadro de coronavírus e seus impactos, inclusive nas relações de trabalho, o Governo Federal, assim como os Estados e Municípios, começam a determinar providências com o objetivo de equacionar as medidas sanitárias com a restrição ao funcionamento e mesmo o fechamento de estabelecimentos, serviços etc (8). Já há notícia, inclusive, de discussão de possibilidade de suspensão temporária dos contratos de trabalho (9). No entanto, nada de concreto nesse sentido foi apresentado até o momento da publicação desse artigo. Destacamos que a situação de atividades restringidas ou paralisadas por determinação legal ou judicial pode ser compreendida como força maior (artigo 501, da CLT), com outras implicações, não abordadas neste artigo.


Assim, apresentaremos aqui alternativas levando em conta a legislação atual e a adoção de medidas por iniciativa do empregador à luz dos impactos decorrentes do COVID-19 sobre os contratos de trabalho.


2.Férias


O empregador pode conceder férias aos seus empregados, individualmente. No entanto, por lei, elas devem ser comunicadas com antecedência mínima de 30 (trinta) dias (artigo 135, CLT) e devem ser pagas antecipadamente (artigo 145, CLT).


O empregador também pode conceder férias coletivas a todos os empregados, ou aos empregados de determinados estabelecimentos ou setores (art. 139, “caput” CLT). As férias coletivas têm o prazo mínimo de 10 (dez) dias (artigo 139, § 1º, CLT) e devem ser comunicadas com antecedência mínima de 30 dias ao empregado e 15 dias ao Ministério da Economia (antigo Ministério do Trabalho) e ao sindicato do trabalhador (artigo 139, e parágrafos 2º e 3º da CLT). Também devem ser pagas antecipadamente (artigo 145, CLT).


Do ponto de vista prático, as exigências referidas acima – prazos, procedimento e pagamento antecipado - podem inviabilizar a concessão de férias na situação aqui analisada. Isso porque teoricamente, o desrespeito a essas condições poderia levar à penalização dos empregadores. Difícil prever se no caso de desrespeito dos requisitos e de eventual discussão judicial poderia se entender que a pandemia em questão autoriza a “flexibilização” da interpretação das normas e de eventuais penalidades.


3.Licença remunerada


Empregador e empregado podem ajustar, de comum acordo, a concessão de licença remunerada. Embora isso não afaste a obrigação da empresa continuar pagando salários, ao menos diminui outros gastos e a responsabilidade (riscos) decorrente de seguir exigindo o comparecimento ao serviço mesmo diante da grave situação que se apresenta.


Corroborando essa possibilidade, a Lei 13.979/20 (10), editada em decorrência do COVID-19, prevê diversas medidas como afastamento, isolamento e quarentena. O artigo 3º, parágrafo 3º, dessa Lei, estabelece que “será considerado falta justificada ao serviço público ou à atividade laboral privada o período de ausência decorrente das medidas previstas neste artigo”. Trata-se de interrupção do contrato de trabalho, hipótese em que o empregador deve seguir pagando salários pelos primeiros 15 (quinze) dias. Depois disso, o trabalhador deverá ser encaminhado ao INSS.


Em artigo sobre o tema (11), Vólia Bomfim Cassar acrescenta que poderá ser ajustado entre as partes, por escrito, “que o período de licenciamento servirá como compensação das horas extras antes laboradas ou adotar a regra do artigo 61 da CLT”. De acordo com a renomada jurista e Desembargadora do TRT do Rio de Janeiro, “quando retornar o patrão poderá exigir, independente de ajuste escrito, até 2 horas extras por dia, por um período de até 45 dias, para compensar o período de afastamento.”


4. Banco de Horas


Para as empresas e empregados que já adotam regime de banco de horas, este momento pode ser apropriado para a concessão das folgas compensatórias, respeitadas as condições legais e pactuadas. Por outro lado e com todo respeito a entendimento em sentido contrário, não nos parece possível criar o banco de horas neste momento e computar o período em casa como “crédito” em favor das empresas para trabalho extraordinário futuro. Tal dinâmica inverte a estabelecida em lei e a nosso ver, por isso mesmo, a contraria.


5.Trabalho em casa


O artigo da CLT prevê a possibilidade de desempenho do trabalho à distância, por exemplo, no domicílio do empregado. Na mesma linha, o artigo 75-A, da CLT e seguintes disciplinam o regime de “teletrabalho”. Ele é definido como“a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologia de informação e de comunicação”(artigo 75-B. CLT, parte final exclui trabalho externo). Esta é mais uma alternativa diante da situação atual, mas a lei também estabelece requisitos para este tipo de trabalho.


O artigo 75-C, da CLT, determina que “a prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho”. Também determina que o contrato deve especificar as atividades que serão realizadas pelo empregado.


A alteração da prestação do trabalho no estabelecimento da empregadora para o teletrabalho é expressamente autorizada por lei (artigo 75-C, parágrafo 1º, CLT). Porém, o empregado deve concordar com a mudança e deve ser firmado um aditivo ao contrato individual de trabalho. Para o caso de alteração por determinação do empregador, é assegurado um prazo mínimo de transição de 15 dias (artigo 75, C, parágrafo 2º CLT). Por fim, é necessário que o aditivo contratual preveja por escrito as condições relacionadas à aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado (artigo 75-D).


Evidentemente nem todo tipo de trabalho pode ser desempenhado à distância. Além disso, do ponto de vista prático, as regras do teletrabalho podem dificultar a implementação urgente dessa alternativa. E, novamente, é difícil prever se em eventual discordância ou litígio, a Justiça consideraria que a pandemia autoriza o descumprimento dessas regras.


Por fim, cabe fazer uma importante ressalva. Se o empregado estiver doente ou naquelas situações previstas no artigo 3º da Lei 13.979/20 (isolado, em quarentena etc), ele NÃO poderá trabalhar. Tais situações são consideradas faltas justificadas, conforme artigo 3º, parágrafo 3º, e o empregador deve pagar os salários correspondentes sem a prestação dos serviços!


6. Norma Coletiva (Convenção ou Acordo)


A Reforma Trabalhista incentivou o uso das Convenções Coletivas e dos Acordos Coletivos como meios de definição das condições de trabalho para os trabalhadores de cada categoria (Convenções) ou de determinada empresa (Acordos). Permite, inclusive, que eles se sobreponham à lei. Sem adentrar em discussões relativas à constitucionalidade ou limites das cláusulas, bem como nos aspectos políticos ou ideológicos que marcam o debate sobre esse assunto, o fato é que as normas coletivas podem se apresentar como uma forma interessante de lidar com a situação apresentada.


Em vista da inexistência de lei que discipline especifica e detalhadamente os efeitos da pandemia de COVID-19 sobre as relações de trabalho, é possível estabelecer as condições mais adequadas a cada categoria e a cada empresa por intermédio de convenções e acordos coletivos. Para tanto, é essencial a participação dos sindicatos de empregados e, no caso das convenções, também dos sindicatos patronais.

Vólia Bomfim aponta como condições passíveis de negociação coletiva, no cenário atual (11):


“suspensão contratual (art. 611-A da CLT) ou a redução do salário do empregado durante o período de afastamento decorrente das medidas de contenção da epidemia, com base no artigo , VI da CF c/c artigo 611-A da CLT.”


“compensação dos dias parados com o labor, por exemplo, de 3 horas extras por dia pelo período que se fizer necessário para a completa recuperação do trabalho ou de comunicação das férias coletivas com antecedência de até dois dias antes de sua concessão, alterando a regra do artigo 135 da CLT, etc.”


As negociações coletivas também tem uma série de formalidades a cumprir, prazos e ônus. Contudo, diante da gravidade e urgência da situação e considerando a possibilidade de versarem sobre condições e particularidades específicas das categorias e empresas, essa ferramenta pode ser de grande utilidade neste momento.


7. E as empresas que não podem parar?

As empresas que seguem em atividade mesmo diante de todo o quadro apresentado, devem adotar práticas para reduzir a exposição dos trabalhadores aos riscos, como por exemplo jornada mais curta, horários de entrada e de saída flexíveis e restrição de atendimento a público. É sempre importante lembrar que os empregadores são responsáveis pela adoção e fiscalização de medidas de segurança, saúde e higiene no ambiente de trabalho. Nessa linha, Francisco Ferreira Jorge Neto, Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante e Letícia Costa Mota Wenzel, recomendam às empresas (12):


“a) disponibilizar máscaras e luvas caso necessário;

(b) orientar os empregados para lavarem as mãos constantemente;

(c) oferecer e orientar o uso de álcool gel;

(d) orientar que não devem compartilhar itens de uso pessoal;

(e) manter o ambiente de trabalho sempre limpo e arejado;

(f) não enviar o trabalhador para locais que haja suspeita dos coronavírus.”


O Ministério Público do Trabalho já emitiu, até este momento, três Notas Técnicas Conjuntas (14), de números 02, 03 e 04 de 2020, com recomendações e orientações de segurança no trabalho, com diretrizes relacionadas ao COVID-19.


O desrespeito a essas e demais orientações sanitárias e medidas de segurança, saúde e higiene expõe os trabalhadores a riscos. Pode implicar severos ônus aos empregadores, especialmente se os empregados efetivamente contraírem a doença. Nesta hipótese, ela poderia até mesmo ser classificada como doença ocupacional, teoricamente atraindo a responsabilização do empregador por danos.


8. Qual a alternativa mais adequada para a sua empresa?


Apresentamos, acima, algumas das alternativas que vislumbramos. Existem outras (13). De todo modo, como deixamos claro, nenhuma das possibilidades é completa e absolutamente adequada aos impactos da pandemia de coronavírus sobre os contratos de trabalho. Todas impõem requisitos, formalidades, prazos, ônus etc.

A escolha da alternativa mais adequada para a sua empresa envolve uma série de questões. Entre elas:


- o tipo de atividade desempenhada;


- a quantidade de empregados;


- a disponibilidade financeira;


- o local onde o trabalho é desempenhado;


- a necessidade e a possibilidade de reduzir ou suspender o funcionamento, etc.


Por outro lado, a pior alternativa é clara: ignorar o coronavírus, como se nada estivesse acontecendo.


Por isso tudo isso, a avaliação do melhor caminho deve ser feita caso a caso e rapidamente.


Por fim, lembramos que se o fechamento ou restrição da atividade decorrer de lei ou decisão judicial, a situação pode ser compreendida como força maior (artigo 501, da CLT), o que teriam implicações diferentes, não abordadas neste artigo.


9. Conclusão


Em vista das obrigações decorrentes dos contratos de trabalho e dos severos efeitos da COVID-19, recomenda-se que as empresas procurem orientação jurídica adequada e completa. A orientação pode ser fornecida por seu sindicato ou por advogado de sua confiança, após análise das particularidades.

De fato, este artigo pretende apresentar sugestões de alternativas conferidas às empresas, a partir da legislação atual. Mas, sem perder de vista que a qualquer momento novas medidas legais podem ser editadas, deixamos claro que a melhor alternativa é a que leva em consideração e atende as condições específicas de cada empresa.


10.Contato em caso de dúvidas


Ficou com alguma dúvida? Mande para:


contato@explicardireito.com.br


- Canal Explicar Direito noYoutube:




- Instagram: @explicar.direito


11.Referências


6 a situação de atividades restringidas ou paralisadas por determinação legal ou judicial pode ser compreendida como força maior (artigo 501, da CLT), com outras implicações, não abordadas neste artigo

13 em vídeo publicado pelo Tribunal Regional do Trabalho, o Juiz do Trabalho Márcio Scalércio propõe, entre outras alternativas, o uso do banco de horas e a suspensão do contrato de trabalho de dois a cinco meses para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, conforme 476-A, da CLT. Link: https://youtu.be/rAoH_idu0ZE.


* Artigo publicado também no Jusbrasil:

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