Em consultorias e nas minhas redes sociais, muitas empresas e trabalhadores me perguntam sobre os direitos do empregado que sofre acidente de trajeto. Algumas dúvidas são “clássicas” – se repetem há anos e anos – mas existem outras que decorrem das reviravoltas legais ocorridas entre 2019 e 2020. Neste artigo, responderei as perguntas mais comuns, devidamente ATUALIZADAS para 2021.
1- O que é acidente de trajeto?
Acidente de trajeto é aquele sofrido pelo trabalhador no percurso da residência para o local de trabalho ou do local de trabalho para sua residência. Ele pode acontecer em qualquer meio de locomoção, seja ele transporte público ou veículo próprio. Tudo isso está previsto expressamente no artigo 21,inciso “IV”, letra “d”, da Lei 8.213/91.
2- Acidente de trajeto é acidente de trabalho?
O acidente de trajeto é equiparado ao acidente de trabalho pelo artigo 21,inciso “IV”, letra “d”, da Lei 8.213/91. Em termos práticos, isso significa que o acidente de trajeto assegura ao trabalhador acidentado os mesmos direitos que o acidente “típico” ocorrido durante a execução do trabalho. Vamos falar sobre isso adiante.
3- E quanto as dezenas, centenas e quem sabe até milhares de artigos, vídeos, etc dizendo que “acidente de trajeto não é mais acidente do trabalho”?
Entre 12 de novembro de 2019 e 20 de abril de 2020, esteve em vigor a Medida Provisória nº 905. Esta MP pretendia criar o famigerado “Contrato de Trabalho Verde e Amarelo” e “flexibilizar” (entenda-se: RETIRAR) diversos direitos trabalhistas. Entre os direitos retirados, de fato estava o de caracterização do acidente de trajeto como acidente de trabalho.
Acontece que as Medidas Provisórias produzem efeitos apenas por um período determinado (provisório!). Para que continuem vigorando, elas devem ser convertidas em lei. No entanto, (felizmente) a MP nº 905 NÃO foi convertida em lei.
Desse modo, os acidentes de trajeto ocorridos entre 12.11.2019 e 20.04.2020 realmente NÃO são considerados acidentes de trabalho, pois a MP nº 905 esteve em vigor neste período e excluía a possibilidade de tal caracterização. Porém, os acidentes de trajeto anteriores e posteriores àquele período são equiparados ao acidente de trabalho.
Assim, se um empregado sofrer acidente de trajeto em 2021, ele tem que ser considerado acidente de trabalho.
4- Quais são os principais direitos trabalhistas e previdenciários do empregado que sofre acidente de trajeto?
A equiparação do acidente de trajeto ao acidente de trabalho assegura ao empregado acidentado diversos direitos trabalhistas e precidenciários. Os principais deles são:
a-) emissão da CAT – Comunicação de Acidente de Trabalho (já falei sobre a CAT neste ARTIGO e neste VÍDEO);
b-) auxílio doença acidentário (código B91) pago pelo INSS, se o trabalhador precisar se afastar do serviço por mais de quinze dias (já falei sobre este benefício neste ARTIGO e neste VÍDEO);
c-) o empregador deverá recolher normalmente o FGTS do trabalhador enquanto ele estiver afastado pelo INSS com benefício “B91”;
d-) estabilidade de 12 meses a partir da alta previdenciária, se o benefício tiver sido o “B91” (artigo 118 da Lei 8.213/91). Neste período, o trabalhador não pode ser dispensado sem justa causa;
É importante destacar que esses direitos só existem como consequência da equiparação do acidente de trajeto ao acidente de trabalho.
O trabalhador acidentado ainda poderá ter outros direitos, dependendo da evolução do seu quadro clínico:
- se não tiver condição de voltar a trabalhar, poderá fazer jus a aposentadoria por invalidez;
- mesmo que retorne ao serviço, mas com sequelas que dificultem as atividades profissionais, ele pode ter direito ao auxílio-acidente (benefício sobre o qual já falei neste VÍDEO e que é DIFERENTE do benefício referido acima, na letra “b”).
5- A empregadora tem que ressarcir as despesas e pagar indenização ao trabalhador que sofre acidente de trajeto?
Esta é uma das dúvidas mais frequentes que recebo em meu escritório e pelas redes sociais. Existe uma resposta relativamente simples (ou simplista) para ela, mas há muito tempo o Direito me ensinou que “o diabo mora nos detalhes”. Por isso, seguramente vale a pena tratá-la de forma detalhada em minha próxima publicação.
Por enquanto, adianto alguns spoilers: via de regra, a empregadora não tem que pagar indenização e nem ressarcir despesas do trabalhador que sofre acidente de trajeto. Isso porque geralmente não há nexo de causalidade (relação de causa e efeito) entre as ações e omissões da empresa e o infortúnio, requisito essencial para indenizações por acidente de trabalho, como abordei neste ARTIGO e neste VÍDEO, que aliás é um dos mais vistos do Canal Explicar Direito. Mas, como eu disse, neste caso a resposta é demasiadamente simples/simplista. Embora se aplique à maioria parte dos acidentes de trajeto, existem exceções.
Falarei sobre tudo isso em minha próxima publicação aqui no Jusbrasil.
6- Conclusão
Com essas considerações, espero ter traçado um panorama geral e atualizado sobre o acidente de trajeto e direitos decorrentes desse tipo de ocorrência, devidamente atualizado para 2021. O que é muito importante, em vista das reviravoltas decorrentes da vigência temporária da MP 905.
Se você quiser saber mais sobre o assunto, assista este VÍDEO que publiquei no meu Canal no Youtube, o Explicar Direito:
Voltaremos a falar sobre acidente de trajeto na minha próxima publicação, mais especificamente sobre o direito do acidentado à indenização.
Para sanar dúvidas sobre o procedimento a adotar em um caso concreto de acidente de trajeto, emissão da CAT, reivindicação de benefício do INSS, etc, é essencial fazer uma avaliação jurídica completa com o advogado de sua confiança.
*Artigo escrito por Marcelo Trigueiros, advogado especializado em acidente do trabalho, doença do trabalho e direitos trabalhistas. Atua em processos administrativos, judiciais e consultorias de forma presencial e pela internet. Formado pela PUC-SP em 2002 e pós graduado (lato sensu), também pela PUC. Sócio do escritório Trigueiros e Duarte Advogados. Autor do blog e Canal "Explicar Direito" (Youtube), presente também no Instagram, Facebook e Twitter. Também publicado no Jusbrasil
Comments